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26/05/2014 - Transgênicos: As sementes do mal. A silenciosa contaminação de solos e alimentos. Por Rubens Onofre Nodari*

Transgênicos: As sementes do mal. A silenciosa contaminação de solos e alimentos. Por Rubens Onofre Nodari*

Resenha do livro Transgênicos: As sementes do mal. A silenciosa contaminação de solos e alimentos de ANTÔNIO INÁCIO ANDRIOLI E RICHARD FUCHS (ORGS.)
São Paulo, Expressão Popular, 2008, 280p.

*Professor titular do Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Santa Catarina

O livro organizado por Antônio Inácio Andrioli e Richard Fuchs aborda de forma multidisciplinar os diferentes riscos e temas associados ao desenvolvimento e à utilização dos transgênicos. Pode até assustar aqueles menos familiarizados com o tema, mas é difícil se contrapor aos argumentos nele apresentados. Dentre os muitos temas e informações fornecidos pelos autores, parte deles será objeto desta resenha, não porque não haja mérito nos demais, mas por pura falta de espaço.

Um dos aspectos bem explorados está relacionado com a lógica econômica perversa e inescrupulosa que tem, em última instância, por objetivo oligopolizar o setor da alimentação. Para tanto, as indústrias biotecnológicas lançaram mão de maciça expansão empresarial no ramo de sementes, incorporando ou comprando empresas de sementes no mundo inteiro. Segundo os autores, em congresso sobre transgênicos em 1999, os objetivos empresariais da Monsanto foram apresentados aos participantes:
no prazo de 15 a 20 anos toda a semente do mundo seria transgênica e, consequentemente, patenteada. A estratégia decisiva que a corporação estaria seguindo, segundo recomendação da Arthur Anderson Consulting Group, seria a influência sobre o governo dos Estados Unidos. Sua função seria a de disseminar os produtos transgênicos no mercado mundial antes que surja qualquer resistência. A indústria espera que, com o passar do tempo, o mercado esteja tão tomado que nada mais possa ser feito contra. (p.31)

E isso já está ocorrendo em alguns países, como Estados Unidos, Canadá, Argentina, Brasil e China. De um lado, a oferta com crescente proporção de tipos transgênicos. De outro, o fluxo gênico que se manifesta implacável, um aspecto também abordado pelo livro. Somente em dez anos de cultivo com OGM (1997-2006), foram registrados 142 casos de contaminação, sendo 35% por milho. Já na primeira safra de milho transgênico no Brasil, o repórter Agnaldo Brito, da Folha de S.Paulo, depois de passar uma semana em áreas cultivadas com milho transgênico e não transgênico, estampou na capa daquele jornal, em 10 de maio de 2009: “País perde controle dos transgênicos”. O motivo de sua conclusão decorreu do fato de que os agricultores mencionaram que não iriam ou não teriam condições de segregar os dois tipos. Considerando que o fluxo gênico é em grande parte provocado pela mistura de sementes, não seria surpresa se, em poucos anos, todas as variedades de milho tiverem transgenes inseridos em seu genoma.

A dominação da indústria de sementes por apenas seis grandes corporações (Monsanto, Syngenta, Dow AgroSciences, Dupont, Bayer e Basf), aliada à contaminação das variedades crioulas pelos transgenes, praticamente impedirá qualquer reação rumo a alternativas, ou mesmo a volta aos convencionais, em casos de efeitos mais graves. Porém mais perverso do que isso é que as sementes transgênicas impedem os agricultores (sobretudo os campesinos) de manterem, sem contaminação, a diversidade genética, que é a base das inovações que vêm praticando desde os tempos da domesticação e da criação da agricultura. Assim, o governo está chancelando o roubo que vem sendo praticado pelas empresas, qual seja, o futuro dos agricultores que querem manter e melhorar suas sementes livres de transgenes.

Dessa forma, a pequena agricultura é obrigada a ceder à agricultura industrial, dominada pelos agroquímicos. Nesse caso, podem ocorrer agressões aos direitos humanos (por exemplo, no Paraguai), falência dos agricultores, processos jurídicos de violação de patentes e exigências de indenização por meio de “contratos abusivos”, enfim, uma submissão dos agricultores à dominação das corporações multinacionais. Segundo o livro, o contrato efetuado no momento da compra da semente “concede à Monsanto o direito de estabelecer mecanismos de controle nas propriedades dos agricultores, os compromete com enormes responsabilidades financeiras e estabelece os direitos que estes possuem em relação à semeadura, colheita e comercialização de sementes transgênicas”. O livro também relata métodos nada ortodoxos de pesquisa adotados pela Monsanto, em países como os Estados Unidos, para punir a violação do direito de patentes, como o envio de cartas ameaçadoras, com o objetivo de intimidar os agricultores e exigir pagamentos compensatórios extrajudiciais. E os consumidores, que direitos perdem? Simplesmente o direito de escolher.

Portanto, a perversidade da tecnologia surrupia também um direito inalienável do consumidor, pelo menos em uma democracia, que é o de escolher os produtos que deseja consumir. Esse tópico é igualmente abordado no livro, que traz informações relacionadas aos consumidores de vários países. Os alimentos transgênicos são de pior qualidade, com menor produtividade e com mais custos econômicos, ecológicos e sociais comparativamente aos convencionais e aos agroecológicos. Por exemplo, uma planta de soja ou de milho resistente a um herbicida poderá ser pulverizada com inseticida, fungicida e agora com herbicida, este não utilizado sobre plantas convencionais. Mais do que isso, as plantas transgênicas produzem proteínas, algumas delas tóxicas ou mesmo agrotóxicas, que não ocorrem nas plantas convencionais. Portanto, os resíduos de herbicidas e seus metabólitos, como de toxinas, em grãos que se tornam alimentos, têm mais veneno que os convencionais e muito, mas muito mais que os agroecológicos, que não sofrem esse tipo de contaminação.

Além de pior qualidade, produzem menos que os convencionais. A constatação, já verificada nos Estados Unidos, vem sendo comprovada aqui no Brasil. Em 17 de junho de 2009, a Fundação Pró-Sementes apresentou, em Porto Alegre, o resultado do desempenho de cultivares de soja indicados para o Rio Grande do Sul na safra 2008-2009. A avaliação de quarenta variedades transgênicas e vinte convencionais em sete municípios apontou que os materiais sem alteração genética apresentaram produtividade média 9% superior. A notícia, publicada no Correio do Povo, demonstra mais uma vez aquilo que havia sido apontado como um dos riscos, a menor produtividade. Os vários artigos incluídos no livro mencionam a insuficiência dos estudos relacionados aos possíveis riscos ao meio ambiente e à saúde humana. Os autores igualmente se referem à inconsistência científica de estudos que relatam a inexistência de perigos dos transgênicos para o ser humano, os animais e o meio ambiente. As experiências em curso compiladas por eles apontam exatamente o contrário: agressões à natureza, ameaças ao ser humano, aos animais e ao meio ambiente. Esses riscos, na verdade, são apenas exemplos, uma vez que outros riscos já foram constatados, como efeitos adversos a organismos aquáticos e outros componentes da biodiversidade, como os inimigos naturais de pragas agrícolas.

A liberação dos transgênicos é desastrosa, constataram os autores, ao levar em consideração os vários efeitos do uso de produtos transgênicos. No caso do Brasil, o desastre poderá ser pior que em outros países, pois a biodiversidade em recursos naturais que o país tem é a maior do mundo.

Entregar esse potencial aos interesses de multinacionais é um problema, em especial a longo prazo, pois, com isso, o Brasil abre mão de sua soberania, de sua capacidade de produzir alimentos. Em resumo, o livro As sementes do mal deve ser lido por todos que estão engajados na discussão sobre os transgênicos, notadamente pela riqueza de argumentos multifacetados sobre as ameaças e os efeitos adversos da transgenia.

Veículo: Internet

Fonte: http://www.andrioli.com.br/index.php?option=com_content&view=section&layout=blog&id=6&Itemid=41